Ansiedade – definição e fatores de desenvolvimento
- Vitor Santiago Borges
- 29 de mar.
- 7 min de leitura

Distintamente da depressão, que manifesta um sofrimento relacionado à autoestima, a ansiedade vincula-se a objetos externos ao sujeito. O deprimido sente-se na maior parte do tempo infeliz, pessimista e em desacordo quanto ao seu valor. Já o ansioso teme permanentemente determinados objetos ou contextos externos que ele identifica como ameaçadores.
A ansiedade se manifesta na dependência do pensamento premeditado, voltado para um tempo hipotético que não está presente. Contudo, ela pode se manifestar tanto na forma de anseio quanto na forma de receio. Na primeira perspectiva deseja-se determinado objeto ou contexto, sentindo uma leve ou forte atração direcionada ao mesmo. Ao antecipar determinado evento em minha mente, sinto-me estimulado, crio expectativas, percebo uma agitação percorrendo meu corpo e mente, e até mesmo sinais fisiológicos se manifestando, como uma palpitação no peito ou uma sensibilidade maior na região do diafragma.
No caso do receio, as reações emocionais e fisiológicas também estão presentes, mas com um acréscimo de agonia crescente, produzindo dentro da pessoa resistências ao acontecimento que antecipa em sua mente, pois seu valor formal é, para ela, ameaçador e longe de ser prazeroso e desejável. Ambos os estados, o anseio e o receio, encontram-se irremediavelmente vinculados ao hábito da antecipação mental.
A especificidade dos estados emocionais ansiosos vincula-se, sobretudo, ao valor de determinados objetos, que representam na mente de cada um, um significado específico. Viajar de avião para uma pessoa possui uma conotação diferente para outra pessoa. Enquanto uma se sente ameaçada por um perigo iminente, a outra se sente tranquila e em estado de repouso diante desta experiência, não vinculando-a a qualquer situação de perigo. Portanto, é a interpretação antecipada do perigo, em razão do seu significado específico, que vai induzir a manifestação da ansiedade que é, em sua expressão psicológica e fisiológica, uma resposta imediata ao medo. Temo determinado contexto ou objeto e por isso sinto ansiedade.
Ocorre, no entanto, que o medo apresenta para nós uma função preservativa. Existem de fato, determinados objetos ameaçadores e minha resposta saudável diante deles é o medo. Esta resposta, diante de uma ameaça real, como o encontro com um tubarão branco ao mergulhar na costa sul africana, manifesta uma reação de profundo desconforto diante do pavor que ela representa. Meu instinto de autopreservação se manifesta e crio reações imediatas correspondentes à situação de ameaça. Em meu íntimo, este contexto apresenta uma ameaça real, pois sei que este predador tem o poder de me devorar.
Entretanto, esta situação é bastante distinta a do pavor que uma paciente sente quando se vê diante de uma barata. A barata não tem o poder de devorá-la como o grande tubarão branco e, contudo, o mesmo pavor se apresenta. Testemunhando, durante a sua infância, a reação de pavor de sua mãe diante de uma barata, a paciente aprendeu a interpretar aquela situação nada ameaçadora como sendo uma ameaça real, muitas vezes sustentada por uma sensação de repugnância. Racionalmente ela sabe que a barata não vai devorá-la, mas a possibilidade de contato físico da barata com ela, a leva a sentir um medo mesclado ao nojo.
Entre o medo real e o medo imaginário há uma imensa e incontornável distância, mas as respostas emocionais e fisiológicas são as mesmas. Quando uma experiência de medo se instala na mente, ela tem o poder de formar uma memória poderosa que emerge sempre que uma associação mental ou uma interpretação associativa se manifesta no campo da experiência. É o caso, por exemplo, do indivíduo que foi contratado para o emprego dos seus sonhos, mas que se sente paralisado e ameaçado em tomar posse daquilo que anseia pelo simples fato do seu local de trabalho estar no último andar da torre de um alto edifício. A necessidade de ter de entrar em um elevador o leva a um estado de intensa ansiedade, impedindo-o de tomar posse do seu sonho. Diante de sua dissonância decide procurar uma terapia, por meio da qual se lembra que na infância, quando tinha cinco anos, seu pai o castigou por uma leve travessura, trancando-o por mais de dez horas em um estreito armário escuro. Sua claustrofobia (medo, pavor de espaços fechados) decorre de uma memória traumática de sua infância. No entanto, a cura de sua claustrofobia envolve uma livre aceitação do seu medo, ou seja, o seu enfrentamento. O sujeito em questão precisa, portanto, aprender a entrar em um elevador, suportar dentro de si a resposta de ameaça a nível cognitivo, emocional e fisiológico, e por meio desta exposição gradual, dessensibilizar-se do trauma e ficar livre desta fobia específica que o impede de ter uma vida mais feliz e plena.
Até aqui pautamos nossa análise da ansiedade em situações específicas, como a fobia da barata e o pânico do elevador. Mas na maioria dos casos, a ansiedade ocorre de maneira difusa e constante. Há um aprendizado reforçador da ansiedade nos contextos de formação dos indivíduos, sejam eles familiares ou escolares.
A chamada ansiedade de desempenho encontra-se presente na maior parte da população, em razão de uma cultura indutora de ansiedade em que estamos imersos. Sob este aspecto, podemos classificar a ansiedade de desempenho como sendo uma permanente tensão do indivíduo em provar o seu valor efetivo, a fim de angariar para si respostas positivamente afetivas. Neste contexto, há dois reforçadores importantes em nossa cultura emocional insalubre: a comparação e a antecipação.
Aprendemos estes reforçadores ambientais que se tornam vícios mentais ao longo de nossas vidas. E estes mesmos hábitos ou vícios mentais determinam as engrenagens de nossas mentes levando-nos ao adoecimento psicológico permanente. As pessoas estão presas em hábitos comparativos e antecipatórios. Ao se compararem umas com as outras, fixando esse hábito em sua experiência mental, desenvolvem circuitos mentais e cerebrais erráticos, indutores da ansiedade e da depressão, pois a passagem de um estado ansioso para um estado depressivo é fácil e a linha demarcatória de ambos é tênue.
Quanto à antecipação das experiências a nível imaginário, característica da ansiedade, encontramos o paradoxo do controle premeditado e da insegurança aprendida. Ou seja, as pessoas simplesmente aprendem a ansiedade e a insegurança em razão de anteciparem suas experiências visando com isso um controle premeditado em vista de um bom resultado ou desempenho. Isto é uma armadilha mental na qual as pessoas caem o tempo todo sem saber. Quanto mais antecipo uma situação vindoura em minha mente, revisando-a até o último momento, mais eu me saboto diante dela. É o caso da ansiedade de desempenho escolar em que o aluno que se prepara para uma prova, revisa o seu conteúdo até dez minutos antes de sua ocorrência, e começa a se esquecer o que aprendeu no curso do seu aprendizado quando se confronta com a prova. O mesmo ocorre com o palestrante iniciante que revisa o material de sua palestra até o último momento, descarregando e produzindo dentro de si adrenalina, bloqueando-se durante a palestra para os conteúdos que já internalizou. Antecipar, portanto, é a principal matriz mental que nutre e desenvolve a ansiedade em nossas mentes.
O público leigo em Psicologia precisa entender um pouco a respeito das engrenagens da vida mental para aprender a ter autogestão e com ela, mais qualidade de vida. Precisa compreender que a mente concentrada em alguma atividade específica, encontra-se em estado relaxado e otimizado e que, portanto, a mente relaxada e concentrada é a mente funcional e assertiva. Por outro lado, a mente agitada e cheia de ruminações vai se tornando disfuncional, desalinhada, desordenada, encadeando sequências de desconfortos emocionais. Torna-se uma mente, por assim dizer, assombrada.
Como, no entanto, eu sei quando minha mente se encontra no modo disfuncional? Quando estou fazendo uma coisa e pensando em outra. Este é o modo disfuncional e enquanto eu não aprender a corrigir a rota da minha mente, aprendendo a estar presente, no momento presente, eu estarei produzindo e industrializando em minha atividade mental a ansiedade e a depressão. Acima de tudo preciso aprender a sair daquela narrativa mental do “tudo sobre mim” que sempre constituirá uma armadilha para minha saúde emocional: “O que eles estão pensando de mim?” “Eu tenho que me programar para falar com o meu advogado amanhã.” “Que julgamento o meu terapeuta fez de mim em razão das minhas confissões desta manhã?” “Será que ele vai me rejeitar?”.
Estes são apenas alguns exemplos da narrativa do “tudo sobre mim” levando as pessoas a perderem horas de seu tempo em torno delas e atolando-as num pântano ansiogênico difícil de sair. O circuito da mente é o do pensamento induzindo sentimentos, que induzem sensações, que por sua vez induzem pensamentos, que voltam a reforçar este circuito, e enquanto a pessoa estiver identificada e apegada a ele, sofrerá.
O que preciso fazer então para sair deste circuito? Pelos menos duas atitudes ou atividades que começam a trazer saúde para a minha mente: em primeiro lugar aprender a cultivar, intencionalmente, a minha atenção no momento presente, o máximo que eu conseguir. Em segundo lugar ir em busca de atividades que sustentem a minha atenção nisto e que tragam algum tipo de gratificação e sentimento de crescimento pessoal. Estas atividades não se relacionam, no entanto, a uma mente com hábitos passivos, como a do jovem que passa horas do seu dia jogando vídeo game, ou de outro que perde horas do seu tempo em sites pornográficos para se refugiar de sua ansiedade. Os hábitos passivos são sempre falsos paliativos que impedem a mente de se apropriar de uma psicodinâmica vital e superior. São necessários hábitos ativos que provoquem no indivíduo um sentimento de permanente crescimento interior. Ler, desenvolver alguma atividade vinculada a área de talento, estabelecer uma agenda de atividades que levem ao sentimento de mais valia e gratificação são alguns exemplos. Em síntese, cuidar de si, se cultivar.
Acima de tudo devemos compreender que somos responsáveis pelo cultivo de nossa mente e que a ansiedade, assim como a depressão, são acima de tudo, hábitos mentais.
Mas estes transtornos não resultam de uma disfunção bioquímica do cérebro? Não totalmente, pois a bioquímica do cérebro em alguns casos é apenas a resposta, a nível cerebral, de um hábito ou vício mental. As famílias com suas comparações e culturas narcisistas, em que o sujeito deve provar seu valor para ser validado e amado, têm uma imensa contribuição nisto. Do mesmo modo, as escolas, tanto de ensino fundamental quanto de ensino médio, com seus reforçadores negativos de desempenho e catastrofização de resultados, reforçam e modelam negativamente os circuitos emocionais e cerebrais dos jovens em nossos dias. Em certos contextos, portanto, a disfunção da química cerebral tem sua origem nos hábitos mentais erráticos que foram aprendidos desde a infância do indivíduo.
O índice de suicídio subiu em 27% entre adolescentes e jovens adultos desde a década de 1990 na cultura brasileira e isto se dá em razão dos níveis crescentes de insalubridade social, não apenas em razão das disfunções econômicas, mas principalmente em razão de uma sociedade cujos valores atuais, tanto nas famílias quanto nas instituições de ensino, estão cada vez mais insalubres e disfuncionais. Falsos valores levam a falsas identidades que, por sua vez, induzem à insegurança e insalubridade emocional. Somente no cultivo de uma cultura de aceitação e valorização de cada indivíduo, em sua singularidade específica, é que alcançaremos os potenciais humanos desejados, e com isto, uma sociedade mais saudável, e menos refém da ansiedade e da depressão.
Vitor Santiago Borges – Mestre em Psicologia Clínica
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